Um dos maiores disparates, na avaliação da taxa de câmbio, é considerar que dólar mais desvalorizado aumenta os investimentos, por baratear as importações de máquinas.
Em artigo recente, a colunista Mirian Leitão – de O Globo – entrevistou o economista Affonso Celso Pastore, que saiu-se com essa jóia do pensamento de planilha:
— No Brasil, a formação bruta de capital fixo é muito dependente das importações. As importações se elevam com a valorização do câmbio real, e isto significa que esta valorização reduz o preço relativo das máquinas importadas, que são fundamentais para a realização dos investimentos — disse.
Vamos entender o significado desse “reduzir o preço relativo”. O professor confundiu o conceito do preço absoluto e relativo e a colunista não percebeu.
Quando decide sobre um novo investimento, a questão mais relevante para o empresário não é o valor da máquina em si (o preço absoluto), mas a relação entre o valor da máquina e o que ela gerará de lucro adicional (o preço relativo).
Em um exemplo simples:
1. Uma empresa adquire uma máquina importada por R$$ 1 milhão e com ela gera um lucro anual de R$ 200 mil. A relação entre o lucro e o investimento é de 1/5. Simplificadamente, significa que ele levará 5 anos para amortizar a máquina.
2. Ai o dólar cai de R$ 2,00 para R$ 1,70 e o valor da máquina cai para R$ 700 mil. Mas como a empresa é exportadora, a queda do dólar reduz seu faturamento para R$ 100 mil. A relação lucro/investimento subiu para 7 vezes. Ou seja, em termos relativos a máquina ficou mais cara, porque passou a exigir mais anos de lucros para ser amortizada.
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Vamos para um modelo mais complexo.
1. A empresa adquire uma máquina por US$ 10 milhões, com financiamento de 10 anos de prazo e 12% ao ano. O valor anual da prestação será de US$ 1.770.000. Com o dólar a R$ 2,00, serão R$ 3.540.000 por ano.
2. Com essa máquina a empresa faturará R$ 30 milhões por ano, 60% no mercado interno (R$ 18 milhões), 40% nas exportações (R$ 12 milhões ou US$ 6 milhões, com o dólar a R$ 2,00). A margem de lucro seja de 15% e o custo de produção respectivamente de R$ 15,3 milhões para a produção interna e R$ 10,2 milhões para a externa.
3. Tirando o custo da produção, o lucro final será de R$ 4,5 milhões – R$ 2,7 milhões nas vendas internas e R$ 1,8 milhão nas externas. Como o valor da prestação anual é de R$ 3,54 milhões, a operação renderá ainda um lucro de R$ 960 mil, depois de amortizada a prestação.
Agora, suponha que o dólar caia para R$ 1,70.
1. O valor da prestação (em reais) cairá de R$ 3,5 milhões para R$ 3 milhões – uma economia aparente de R$ 500 mil.
2. No entanto, o faturamento das exportações cairá de R$ 12 milhões para R$ 10,2 milhões. Como o custo de produção das exportações ficou em R$ 10,2 milhões, as exportações não geraram lucro algum.
3. Como consequência, o lucro total gerado pela máquina caiu de R$ 4,5 milhões para R$ 2,7 milhões, ficando inferior ao valor do financiamento. Em termos relativos, ficou inviável a aquisição da máquina, mesmo com a redução do seu preço em reais.
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Por aí fica demonstrada essa falácia do preço absoluto do equipamento. O real apreciado pode baratear máquinas, mas desestimula investimentos.
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